Vila Rica e a Barquinha, por Fernando Freire 

Vila Rica ou Ouro Preto, Minas Gerais, Brasil. Por baixo do casario colonial encontram-se centenas de minas e o mapa subterrâneo é como um grande queijo suíço. Durante o século XVIII, 800 toneladas de ouro foram enviadas para Portugal, mas essa é a estatística oficial, não sabemos contar o metal que circulou de forma clandestina ou que se descaminhou. Hoje quero recordar António José Vieira de Carvalho.

Nasceu em Atalaia, Vila Nova da Barquinha, no ano de 1756. Foi cirurgião mor do reino e cidadão ouro-pretano por missão. Era filho de José Gomes Vieira e Catharina Roza. Foi batizado na Igreja de Nossa Senhora da Assunção, hoje monumento nacional, sendo os seus progenitores católicos. À data do seu batismo, a paroquial pertencia ao padroado real, prelazia de Tomar e diocese de Lisboa. O seu registo de nascimento não se encontra disponível nos arquivos nacionais, certamente, pela incúria dos homens pelo que as informações biográficas “são retiradas do seu testamento que se encontra no Arquivo Histórico do Museu da Inconfidência, em Ouro Preto, Minas Gerais…” 1

Memoramos que a cidade de Lisboa foi destruída em 1755, pelo inesquecível terramoto ocorrido no dia 1 de novembro que fez ruir a maior parte das edificações da cidade, seguido pouco tempo depois de uma onda gigantesca, maremoto, que submergiu quase por inteiro a zona da baixa, local para onde tinham fugido os lisbonenses para se protegerem da queda dos edifícios. Seguidamente, começaram a propagar-se os incêndios urbanos, muitos deles como consequência das velas acesas nos templos e oratórios privados, pois era dia de Todos os Santos. A cidade ardeu por 3 dias desmoronando o pouco que tinha restado do abalo sísmico.   

A reconstrução da capital coube a Sebastião Carvalho e Melo, mais conhecido por Marquês de Pombal, sendo considerado, ainda hoje, uma das figuras mais controversas da história de Portugal devido ao binómio estadismo-despotismo. Recorria, frequentemente, à tortura e aos mandatos de prisão para com os seus adversários, maioritariamente, da nobreza e do clero ou para quem colocava em crise o seu iluminado pensamento.

Contudo, foi uma figura carismáticas da nossa história pela visão do plano urbanístico para a nova Lisboa que “refletia a conceção que o estadista tinha do Estado: planta geométrica e retilínea, alçados iguais para todos os edifícios, ausência de palácios ou qualquer sinal exterior que pudesse sugerir a nobreza do proprietário. Nenhuma porta diferente. A preocupação com a uniformidade foi ao ponto de se decretar a proibição de alegretes ou vasos com cravos às janelas.2

Introduziu na construção civil a “gaiola pombalina”, elemento de construção estrutural tipicamente português, composta por elementos de madeira verticais, horizontais e diagonais que garante uma boa capacidade de defesa e resistência dos edifícios aquando da ação sísmica.

Neste tempo governava a patriarcal de Lisboa, Dom José Manoel da Câmara, também natural da Atalaia. Nasceu em 25 de dezembro de 1686 e aqui veio a falecer em 9 de julho de 1758. Foi o segundo Patriarca de Lisboa, cargo que exercia desde 1754. Era filho dos quartos condes de Atalaia. Os seus restos mortais encontram-se sepultados no altar-mor desta Igreja Matriz da Atalaia.

Pintura do Cardeal Patriarca de Lisboa, Dom José Manoel da Câmara, propriedade da CM de Lisboa

Os historiadores referem que o cardeal foi muito louvado pelo zelo com que acudiu aos povos depois da cidade ruir ao terramoto e aos incêndios. Recordo que o povo ajuizou que o terramoto era um castigo do céu!

À data existiam graves acusações sobre os jesuítas, denúncias que se baseavam em factos propositadamente excessivos para descrédito da Companhia de Jesus mormente pela sua proteção à nobreza e ao clero. No fundo pretendia-se conseguir que o patriarca perseguisse esta congregação. Certamente, a instâncias do Marquês de Pombal que já lhes proibira que pregassem na igreja patriarcal, depois de serem proibidos de pregar na capela real.

No princípio de junho de 1776 tentou-se arrancar ao patriarca uma ordem violenta de perseguição aos Jesuítas, a de os suspender de confessar e pregar na diocese de Lisboa. O marquês de Pombal dirigiu-se ao paço patriarcal e ali instou o cardeal a obedecer-lhe, recorrendo a todos os meios que lhe inspirava a sua perversidade. Disse ao prelado que era aquela a vontade de El-Rei, e que seria irremediavelmente destituído da patriarcal se não cumprisse a sua ordem.

D. José Manoel, septuagenário e doente, hesitou perante a ameaça, e pediu tempo para decidir. O ministro, vendo que ele fraquejava, aumentou os esforços até que o obrigou, depois de cinco horas de resistência, a dar a ordem naquela mesma tarde. Mesmo de noite a imprimiram, e na manhã seguinte apareceu afixada por toda a cidade a ordem de proibição de fazer comércio, de pregar e confessar.

Esta coação desgostou profundamente D. José Manoel e apressou-lhe talvez a morte. Refere o autor das Anedotas do Ministério do Marques de Pombal que, por ocasião de receber o Sagrado Viático, o patriarca declarou publicamente a inocência dos jesuítas, e fez atestá-lo num auto a que mandou dar toda a publicidade, para desengano dos povos e descargo da sua consciência. Será desnecessário acrescentar que tal documento nunca apareceu.3

Com o desgosto das violências que o obrigaram a cometer contra os jesuítas, perseguido por Pombal, abandonou a patriarcal e veio “tomar ares” para a sua quinta na vila da Atalaia, em Vila Nova da Barquinha, onde veio a falecer em 9 de julho de 1758.

Ainda falando do terramoto…

Importa recordar que a vila da Atalaia quase nada sofreu com este sismo. Esta localidade está implementada numa zona correspondente à depressão do Tejo, limitada por falhas e permanece fora das principais “linhas sismo-tectónicas”, tal e qual como Tancos. Já na então Vila de Paio de Pele (Praia do Ribatejo) os efeitos foram relevantes:

Nesta freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Paio de Pele Prelazia de Tomar se sentiu principiar o Terremoto no primeiro de novembro, pelas nove horas e quarenta minutos da manhã pouco mais, ou menos; e duraria cinco ou seis minutos. Fez dois intervalos, e sempre ia crescendo com violência maior, até que de repente findou. Não se percebeu, se foi maior o impulso da parte do Sul, ou se da parte do Norte, mas alguns telhados de casas especialmente o da Igreja Matriz desta freguesia, se vem danificados da parte do sul, e sem dano da parte do Norte. Nesta freguesia não se arruinou casa alguma, só na Igreja Matriz abrirão algumas rachas nas paredes e se descompôs o telhado … O convento o Loreto padeceu algum dano. A sacristia se acha quase arruinada e especada, e na abobada da Igreja abriu uma racha pelo meio desde o frontispício até ao altar mor. Defronte do mesmo convento para a parte do Sul; e no meio do Rio Tejo está situado o Castelo de Almourol que antigamente foi grande fortaleza e habitação dos Comendadores de Almourol, porém já está haverá cem anos desabitado e arruinado por muitas partes; e com o impulso do Terramoto lhe caio da parte do Sul um bocado de parede que teria duas braças; e além das ruinas antigas não se lhe conhece mais que esta. Ainda que todas as pessoas desta freguesia sentiram o grande abalo, e ficarão como atonitas com o susto nenhuma morreu nem perigou. Depois do primeiro Terramoto tem repetido muitos mais pequenos que por continuados se lhe não dá número só se observa que sucedem mais de noite, que de dia, e são mais frequentes quando a lua faz quarto e nenhum dano tem causado. Antes do primeiro Terramoto ninguém se lembra de outro semelhante … [Relato de 18 de fevereiro de 1756, do vigário, Frei António José da Assumpção, in Inquéritos Paroquias.]

Casa da mina junto da fonte do Convento do Loreto – propriedade do Exército Português 

Depois do terramoto os lençóis freáticos no nosso concelho sofreram mudanças significativas, nalgumas fontes aumentou o caudal, enquanto outras secaram, como aconteceu à que existia na cerca do antigo convento do Loreto, junto do castelo de Almourol.  

Em 1774, Vieira de Carvalho foi atraído para o múnus da medicina pelo que deixa a casa dos pais, em Atalaia, e parte para a capital do reino onde frequenta o curso de Cirurgia. Termina o seu curso, com a idade de 23 anos.

Viera de Carvalho irá praticar o seu múnus e fortalecer os seus conhecimentos além-mar, em terras de Vera Cruz.

No outono do ano da graça de 1779 no cais de Belém, de onde em 1432 e 1444, respetivamente, havia partido Gonçalo Velho de Cabral, cavaleiro da Ordem de Cristo, comendador de Almourol, senhor de Pias, Cardiga e Beselga, e criado do infante D. Henrique, mandatado para descobrir as ilhas de Santa Maria e São Miguel, embarca o jovem Vieira de Carvalho que acompanha a comitiva do novo governador da Capitania de Minas Gerais, então nomeado.

Lisboa, 1572. Obra consultada na Sala Manoscriti e Fondi Antichi, ds Biblioteca Civica “Angelo Mai”, Bergamo, Itália.

Quando entrou na colónia do Brasil teria que cumprir as regras estipuladas em 16 de maio de 1744, previstas no regimento geral dos delegados e juízes comissários do cirurgião-mor e físico-mor.

Já em Vila Rica rapidamente ascende na hierarquia social: “Toma posse em 15 de junho de 1781, no cargo de assistente de cirurgia, no Real Hospital Militar de Vila Rica. A instituição atendia as praças e oficiais do Regimento Regular de Cavalaria da Capitania de Minas Gerais, onde encontro o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Em pouco tempo, graças à sua dedicação e seu conhecimento, o Governador promoveu-o ao cargo de Cirurgião-Mor daquele hospital, cargo que vai exercer até sua morte.” 1

Além do múnus de cirurgião verificamos que também se dedicou à política, pois, compulsando a relação dos vereadores e outros oficiais da Câmara de Vila Rica do Ouro Preto – Minas Gerais, Brasil, para os anos de 1711 a 1828, Câmaras de Minas Coloniais seguindo as Ordenações do Reino, verificamos que fez parte:

86.ª Câmara – ano 1796, é 3.º vereador, Cirurgião mor Antônio José V. de Carvalho

90.ª Câmara – ano 1800, é Juiz mais moço, Cirurgião mor Antônio J. Vieira de Carvalho

97 ª Câmara – ano 1807, é Juiz mais moço, Cirurgião mor Antônio José V. de Carvalho

Todavia, se Vila Rica era farta em ambições materiais e pessoais, também era farta em processos tumultuosos e de sublevação social devido às condições desumanas praticadas pelos colonos para com os povos escravizados.

Balança de 1767 para pesar os negros escravizados – Museu de Artes e Ofícios, Belo Horizonte

Lembro que D. João V, na colónia do Brasil, fazia a cobrança dos quintos do ouro, ou seja 1/5 do ouro explorado ficava para a coroa. Mas muito ouro fugiu ao controlo da Fazenda Real e não entrou nas receitas do Reino.

A lei de 11 de fevereiro de 1719, veio a determinar que (…) para a arrecadação dos seus quintos se erguessem Casas de Fundição nas Minas, nas quais seria reduzido a barras todo o ouro extraído, cobrando-se nelas o que se lhe devia. Os mineiros reclamavam contra as Casas de Fundição e o pagamento do quinto, alegando que o trabalho de extração era difícil e que a aquisição de negros escravizados era muito dispendiosa. Houve várias revoltas contra o chamado “quinto dos infernos”.

Muito ouro, enviado para Portugal, era escondido em caixas de açúcar e no próprio navio, a ponto de o governador do Rio de Janeiro escrever ao rei em julho de 1730, dizendo: “Se Vossa Majestade pagasse os navios e a carga para descobrir o ouro, desfazendo os navios e abrindo a carga, lucraria a sua Real Fazenda 500%”.

Na colónia, a experiência fracassada do uso de mão-de-obra nativa iria resultar na adoção da escravatura negra e o recurso a outros territórios do Reino. Durante anos e anos vieram braços vigorosos de África, da imigração forçada e desumana. Estes braços formariam o esteio da economia mineira de várias épocas.

Os povos escravizados africanos ou índios serviam para labutar na mina e até meados do século XVIII, para o transporte de cargas, pois na colónia empregava-se, principalmente, a força humana “… nas costas, nos ombros, no pescoço e na cabeça de homens é que se arrebatavam não só fardos e caixas de mercadorias como também viajantes, estes escanchados no cangote, ou então, como preferiam os mais comodistas e aquinhoados, espichados em redes frescas e acalentadoras ao balanço ritmado das passadas dos carregadores“.4

A região das Minas era o centro vital da economia da colónia.

A partir das origens indígenas, Vila Rica veria a sua evolução social fazer-se com desenvoltura suficiente para, já na metade do século XVIII, ter condições de apresentar, em certos setores, resultados comparativamente iguais ou até superiores aos da capital do Reino.

Ora, em 1789 eclodiu a Inconfidência Mineira. A filosofia das revoluções americana e francesa tinha chegado ao Brasil. Cogita-se um regime republicano com a criação de parlamentos locais subordinados a um parlamento regional. A revolta tem apoio de alguns homens ricos e influentes que querem alterar os regulamentos de exploração de diamantes e do ouro, congelar o imposto da derrama, marcar eleições anuais, fundar uma universidade, acabar com o monopólio comercial português, etc.

Praça Tiradentes e Museu da Inconfidência – Ouro Preto –

Dessa revolta sobressai um nome: “Tiradentes”. Nome popular de Joaquim José da Silva Xavier, colega do cirurgião mor António. Era oficial militar e era, ainda, dentista amador. Fez parte integrante da Inconfidência Mineira, a designação da conspiração contra o Reino de Portugal que foi preparada pela elite de Minas Gerais. A denúncia do movimento fez com que o “Tiradentes” fosse preso, investigado e condenado à morte. O dia de sua morte, 21 de abril, é um feriado nacional brasileiro.

Em suma, inicia-se uma revolução de mentalidades e de agitação cultural que veio a tornar possível a independência da colónia no ano de 1822.

O Museu da Inconfidência foi construído entre 1785 e 1855 e foi Casa de Câmara e Cadeia. Na década de 1930, os restos mortais dos inconfidentes extraditados para a África foram trasladados de volta ao Brasil e instalados no Panteão dos Inconfidentes, imponente e respeitoso salão do edifício. Posteriormente, por meio de decreto-lei, todo o prédio foi transformado em museu, função que exerce desde 1944.

A exposição permanente do museu aborda a Inconfidência a partir da relação com diferentes aspetos da vida em Ouro Preto entre os séculos XVIII e XIX. Nos dois pisos as salas são dedicadas a diferentes aspetos, como mineração, transportes, construção civil, pintura e escultura, arte e religião. 

O Museu da Inconfidência conta com três anexos, dois deles logo ao lado do prédio principal. No primeiro anexo fica o Auditório (sala de projeções), a Sala Manoel da Costa Athaíde (exposições temporárias) e a reserva técnica.

No segundo anexo funciona a Diretoria, a Secretaria, os setores de Museologia, Difusão do Acervo e Promoção Cultural, Segurança e o Laboratório de Conservação e Restauração, este com ateliês de pintura, escultura, madeira e papel. A Casa do Pilar, terceiro anexo, abriga o Arquivo Colonial, com cerca de 40 mil documentos.

Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos construída entre 1765 e 1785 pelas irmandades de negros escravizados e libertos, que não podiam frequentar as igrejas dos brancos e Casa da Ópera de Vila Rica, hoje Teatro Municipal de Ouro Preto, o mais antigo teatro das Américas. Foi construído em 1769 por João de Souza Lisboa e inaugurado em 6 de junho de 1770, no aniversário do Rei Dom José I.

Ouro Preto é uma das principais cidades históricas brasileiras que privilegia o barroco. O estilo, utilizado nas igrejas do período colonial, tinha o objetivo de atrair os cristãos dando ênfase à riqueza dos pormenores, aos adornos e ao uso do ouro presente na região mineira.

As igrejas, antes construídas em adobe, com o tempo deram lugar a outras edificações maiores e mais imponentes.

As igrejas de Ouro Preto são consideradas Patrimônio da Humanidade pela UNESCO. No séc. XVIII foram construídas em Ouro Preto muitas casas, pontes e chafarizes.

Eloquentes criativos laboravam nas letras, na música, na construção civil, na escultura, na talha, na pintura e na arte da prata. Entre eles destacam-se: Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga, Antônio Francisco Lisboa “o Aleijadinho”, Manuel da Costa Ataíde, etc., pessoas que contaram com a participação de portugueses de nomeada que, numa conexão de mestre e discípulo, ajudaram a aprimorar os talentos nativos.

A região das Minas seria um lugar doloroso para alguns, mas pujante para outros, quais terras raras dos tempos atuais. Estamos perante uma região que promoveu riqueza e insurreições, mas que, afinal, soube, com tolerância, interagir com os seus verdugos e criar, outrossim, riqueza material, espiritual e cultural.

Museu da Inconfidência – Ouro Preto – Livro do cirurgião António Viera de Carvalho, do ano de 1801

Podemos acrescentar que José Vieira de Carvalho foi um cirurgião atualizado e dedicado. À data da sua morte, em 1818, no seu testamento, encontramos uma relação bibliográfica de 127 títulos de importância essencial para o estudo da medicina de então.

Da sua obra de 1801, “Observações sobre as Enfermidades dos Negros: suas causas, seus tratamentos, e os meios de as prevenir”, uma tradução para a língua portuguesa da obra de Jean-Barthélemy Dazille, cirurgião francês, apuramos no preâmbulo da obra a sua inquietação pela alta mortalidade dos negros escravizados e a sua dor pelo sofrimento destes.

Damos-lhe a palavra: “felizmente o meu destino me havia levado a ocupar nas Minas Gerais o emprego de Cirurgião Mor do Regimento de Cavalaria, que guarnece a Capital daquela Capitania; onde exercendo, a par da minha profissão, a Medicina prática, pude ver com os meus mesmos olhos, quanto a espécie humana sofre na inumerável multidão dos Negros, que ali transporta a escravidão, e o comércio. A mudança de clima; a diferença de tratamento; um trabalho continuo, e desmedido; e até a fome raríssimas vezes interrompida; junto à triste consideração do seu penoso estado, são outras tantas causas das singulares e gravíssimas enfermidades, a que é sujeita entre nós esta raça desaventurada de homens; e que fazendo-lhes a vida pesada, e adiantando-lhes a morte, levam à sepultura o melhor dos cabedais daquela, e das outras Colonias da América Portuguesa; enterrando com eles o mesmo ouro, que os seus braços haviam desenterrado; e secando assim na sua origem um dos primeiros mananciais das riquezas da Coroa, e do Estado.”

José Vieira de Carvalho não se dedicou só à ação médica e à politica sendo, também, um empreendedor.

Em 1803 criou a cerâmica Saramenha, a primeira de Minas Gerais que espalhou a louça vidreira mineira por toda a região. Recentemente, em 1998, com a missão de resgatar para Ouro Preto a fabricação da mais antiga cerâmica vidrada brasileira, a Cerâmica Saramenha, Paulo Rogério Lage 1 quis valorizar o espírito do lugar. Para tal ao barro da cerâmica e da azulejaria, juntou madeira e metal. Hoje fabrica diversos produtos irmanados da tradição do pulsar brasileiro e mineiro.

Naquele sublime lugar há um Centro Cultural vivo com cursos, palestras, eventos, música, dança, teatro, sem nunca esquecer o sentido principal de um verdadeiro centro de pensamento: a humanidade e a tolerância!

Saramenha artes e ofícios – Rodovia dos Inconfidentes, Km 85, Santo Amaro do Botafogo, Ouro Preto

Fotografias de Fernando Freire

Bibliografia

1 Lage, Paulo Rogério. “A vida e a Obra de António José Vieira de Carvalho Cirurgião-Mor do Regimento de Cavalaria Regular da Capitania de Minas Gerais Primeiro Professor de Anatomia, Cirurgia e Arte Obstetrícia do Brasil no Hospital Real Militar de Vila Rica”. Palco Editora, 2019.

  • Paulo Rogério Lage é economista e escritor. Em 2003 publicou a obra, Casa Rural Mineira – Um Guia de Construção. Em 2010 publicou: Cerâmica Saramenha: A Primeira Manufatura de Minas Gerais.
  • É, também, produtor cultural e tem uma trajetória ligada a dois grupos de destaque no Brasil: Grupo Corpo e Orquestra Ouro Preto. Presidiu a importantes instituições brasileiras como a Rádio Inconfidência e foi diretor do Palácio das Artes, em Minas Gerais.

2 Saraiva, José Hermano. História Concisa de Portugal, Publicações Europa-América, 2003

3 Almeida, Fortunato. História da Igreja em Portugal, Academia de Ciências de Lisboa, Volume II, Livraria Civilização, Porto e Lisboa, 1970

4 Goulart, José Alípio. Tropas e Tropeiros na Formação do Brasil, 1961

Fernando Freire, advogado de formação, é investigador da História Local e presidiu à Câmara Municipal de Vila Nova da Barquinha entre 2013 e 2025.

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