Sobretudo na agricultura, com populações oriundas do subcontinente indiano, os padres da região do Oeste e do distrito de Santarém vão identificando casos de exploração laboral de imigrantes. Mas segundo a diretora da Obra Católica Portuguesa de Migrações (OCPM), Eugénia Quaresma, há falta de recursos humanos e de formação para dar resposta pastoral a estas pessoas. Decorre esta quinta e sexta-feira, dias 12 e 13 de agosto, a peregrinação aniversária do Santuário de Fátima dedicada aos migrantes e refugiados.
Na conferência de imprensa que antecede o início das celebrações, este dia 12, foi questionado ao grupo de representantes de instituições eclesiásticas presente que respostas existem da parte da Igreja para combater problemáticas como a exploração laboral de imigrantes no país.
O padre Rui Pedro, missionário scalabriniano da Missão Católica de Língua Portuguesa no sul do Luxemburgo, lembrou que foi a Igreja, através da Cáritas Diocesana, que primeiro denunciou os abusos laborais a imigrantes que tinham lugar em Évora e Beja, sendo que o denunciante acabou por ter que andar com escolta policial para sua proteção.
“Não esperava encontrar o fenómeno expandido no Oeste”, admitiu, referindo que da informação que lhe chega dos padres locais é que este tipo de abuso se verifica na apanha da pera rocha, em particular com populações naturais do Nepal e do Bangladesh que chegam por redes clandestinas. Sabe também, adiantou, que já há filipinos nas traineiras portuguesas.
“Seria um desafio grande às paróquias de Portugal” procurarem perceber nas suas terras que problemas existem desta natureza, comentou.
Já Eugénia Quaresma referiu que desde o início do século se tem procurado dar resposta às problemáticas do tráfico humano, mas é preciso mais esforço para denúncia e proteção dos envolvidos. Sendo que, constatou, “também há portugueses a serem explorados na União Europeia”.
Ao mediotejo.net, a responsável da Obra Católica Portuguesa de Migrações adiantou que no distrito de Santarém estão identificados os mesmos fenómenos ligados à exploração laboral agrícola do Oeste, com o mesmo tipo de nacionalidades do subcontinente indiano, que chegam por redes de tráfico humano e a quem são retirados os passaportes, ficando a viver em condições precárias.
“O bispo D.José Traquina ficou muito chocado quando se apercebeu que isto também acontece em Santarém. Existe de facto esta preocupação de como acompanhar” estes problemas, frisou.

“Qual o nosso problema dentro da Igreja: é encontrar pessoas motivadas para acompanhar esta área de uma forma pastoral”, explicou. “Esta tem sido a grande dificuldades na área de Santarém. Infelizmente, como é a lei da vida, as nossas equipas vão envelhecendo e precisávamos que gente mais jovem aderisse. Precisamos de apostar na formação dos agentes pastorais”, referiu, comentando que pandemia também foi um momento de repensar novas estratégias para este setor.
Durante a conferência, o Cardeal arcebispo do Luxemburgo, D. Jean-Claude Hollerich, que presidente a peregrinação aniversária, deixou ainda uma crítica à forma como a União Europeia tem gerido a questão dos refugiados. “É inadmissível que nos campos de refugiados junto às fronteiras da União Europeia se vivam em condições desumanas”, afirmou. O responsável salientou que os políticos europeus falam muito mas agem pouco e há vários acordos, como o de direito de asilo, que não são respeitados.
“Arriscamo-nos a perder a nossa humanidade”, frisou.
Não se pode olhar os migrantes só para tapar o buraco da demografia
“[Os Censos 2021] vieram confirmar aquilo que já se dizia há muito tempo, que a nossa população portuguesa está a envelhecer, que precisamos do contributo da imigração mais jovem. Agora, não podemos olhar para os migrantes só como esta força de trabalho, só para tapar o buraco da demografia”, afirmou à agência Lusa Eugénia Quaresma.
A diretora da OCPM salientou que a diminuição da população não é apenas em Portugal, apesar de o país ter “números muito grandes”, mas “acontece um bocadinho por toda a Europa”.
Destacando que são precisos imigrantes, Eugénia Quaresma disse que esta situação leva a pensar nas políticas a nível global e de como se deve estar alinhado, “para que haja, de facto, esta liberdade de circulação regulada”.
“Reconhecemos o direito que os Estados têm de regular a migração. Mas temos de prever esta mobilidade, que faz parte, e olhar, também, para os migrantes como sujeitos de desenvolvimento e não só como pessoas que vêm trabalhar, mas que querem melhorar a sua vida e que podem contribuir para o desenvolvimento dos países de origem”, declarou.
A diretora da OCPM, organismo da Conferência Episcopal Portuguesa, referia-se àqueles que “vêm para Portugal que podem ser agentes de desenvolvimento para os seus países de origem”, mas, igualmente, à diáspora portuguesa, que “pode ser um agente de desenvolvimento para Portugal, nomeadamente nas zonas” onde há maior despovoamento.
Eugénia Quaresma acrescentou que em maio organizações católicas para a imigração e asilo pediram audiências a deputados e ao primeiro-ministro para refletir sobre a habitação, “quando veio a lume” a questão de Odemira.
“Sabemos que é um problema transversal na sociedade portuguesa e gostaríamos muito de contribuir para melhorar, para encontrar uma solução. E, portanto, se calhar um primeiro passo era que fossemos ouvidos”, notou.
No final de abril, o Governo decretou uma cerca sanitária devido à pandemia de covid-19 em duas freguesias de Odemira, que durou até 11 de maio, medida justificada com a “situação de particular gravidade” que o concelho alentejano registava, sobretudo entre trabalhadores temporários do setor agrícola.
Os casos detetados na pandemia entre os imigrantes que trabalham na agricultura denunciaram as condições desumanas em que muitos deles vivem, tendo envolvido realojamentos.
Segundo os resultados preliminares dos Censos 2021, divulgados em 28 de julho pelo Instituto Nacional de Estatística, Portugal tem 10.347.892 residentes, menos 214.286 do que em 2011. Trata-se de uma quebra de 2% relativamente a 2011.

A peregrinação do migrante e do refugiado faz parte da 49.ª Semana Nacional de Migrações, que começou no domingo e termina no dia 15. Tem como tema “Rumo a um nós cada vez maior”.