Foto: mediotejo.net

Foi um início de noite fria, que depressa aqueceu sob mote solidário e onde através da celebração religiosa o povo se uniu juntamente com os párocos de Abrantes e membros da comunidade ucraniana residente no concelho, rezando pela paz e pelo fim da guerra que tem obrigado famílias a separarem-se, homens e mulheres a lutarem e armarem-se para defenderem os seus bens e localidades, enquanto a outros só lhes resta sair e se refugiam nos portos de abrigo fornecidos por outros países, a milhares de quilómetros de casa, deixando tudo para trás.

A praça encheu-se de calor humano, de esperança a cada chama de vela acesa que conjugada com as lanternas dos telemóveis formavam a metáfora perfeita sobre trilhar um caminho de luz, iluminando e apontando uma nova direção para alcançar um futuro risonho, tranquilo e sem mais dor, destruição, mortes e sofrimento.

Abrantes provou, uma vez mais, estar com o povo ucraniano, e na fachada do Município permanecerá até a guerra acabar – juntamente com as bandeiras do concelho e da República Portuguesa – a bandeira da Ucrânia.

Marcavam as 19h30, e o largo foi enchendo, com famílias inteiras, miúdos e graúdos, a quererem estar presentes nesta vigília. Havia bandeirolas de fita, balões, peças de roupa azuis e amarelas, e muitas velas para serem acesas durante as preces.

A iniciativa começou com o hastear da bandeira ucraniana nos Paços do Concelho pelo colaborador da Câmara Municipal, de nacionalidade ucraniana, Maksim Darmogray. Afirma o presidente da autarquia que só dali sairá quando a guerra terminar.

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A celebração foi presidida pelo pároco António Castanheira, de Abrantes – S. João e S. Vicente, e contou com presença do padre ortodoxo de nacionalidade ucraniana, Ivan.

De Abrantes seguiram as orações e preces, e ainda os dons e ofertório que serão remetidos para apoiar o povo ucraniano refugiado no concelho.

ÁUDIO | Padre António Castanheira – Paróquias de Abrantes – S. João e S. Vicente

Nos rostos e nos gestos, nas vozes que foram entoando nos cânticos junto com o coro e em uníssono o cumprir de cada oração, tudo ajudou a compor aquela “praça de gente madura” ciente do sofrimento e efeitos do conflito que a guerra entre Rússia e Ucrânia estão a provocar nos seus povos, com vidas humanas que se perdem dia após dia.

No altar, a imagem de Nossa Senhora de Fátima, e nas suas costas, na fachada dos Paços do Concelho, junto às faixas azul e amarela, a maior prece de todas: a paz.

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Esta foi uma iniciativa que contou com organização do Município e das paróquias de Abrantes, e Manuel Jorge Valamatos, presidente da Câmara, chegou a receber lembranças simbólicas por parte do Padre Ivan Bukakov, ucraniano, da Igreja Ortodoxa Ucraniana do Patriarcado de Constantinopla.

Pelas suas mãos foram entregues aos restantes párocos, nomeadamente um boné que entre os dizeres tinha “STOP PUTIN” e apelava ao fim da guerra.

Com familiares também no seu país a lutarem para o defender, tal como às suas casas, lembrou a irmã que por lá quer ficar a defender a casa que os pais construíram e que não quer deixar para trás. Esta semana seguirá até à fronteira, numa carrinha de nove lugares, onde levará bens alimentares, roupas e material médico e no regresso trará mais cidadãos que precisem de refúgio em Portugal.

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Num discurso feito de olhos rasos de água, falando a realidade vivida no seu país e agradecendo a solidariedade e generosidade dos portugueses por logo terem aberto as portas de suas casas e oferecerem o seu contributo em recolhas solidárias, o cristão ortodoxo pediu sobretudo que se tenha fé, que se reze pelo fim da guerra e para que as preces sejam atendidas e se viva, de novo, em paz.

ÁUDIO | Padre Ivan, de nacionalidade ucraniana e cristão ortodoxo

“Slava Ukraini”, entoou, recebendo o retorno “Heroiam slava!”. Glória à Ucrânia. Glória aos Heróis. E um forte aplauso dos presentes envolveu a saudação nacional ucraniana, acolhendo as dores desta pátria de Leste, que apesar das hipotéticas barreiras ou distanciamento físicos, de idioma e costumes, tem merecido o empenho e apoio das diversas comunidades da região do Médio Tejo e por todo país.

Foto: mediotejo.net

No final da sessão o presidente da Câmara, Manuel Valamatos, falou sobre a adesão à iniciativa e sobre a resposta da comunidade ao acolhimento dos refugiados da guerra, aludindo às organizações que têm sido feitas pelo Município, pela Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo, pela Igreja, demais instituições e sociedade civil.

O autarca disse que esta vigília representou “uma manifestação de desagrado perante esta guerra inexplicável… ou com dificuldade de explicação. E é mais um sinal de que Abrantes está junta e unida” em prol desta causa solidária para com o povo ucraniano.

ÁUDIO | Manuel Jorge Valamatos, presidente da CM Abrantes

O concelho está a preparar-se para a chegada constante de refugiados, preparando estruturas de acolhimento em diversos regimes, e em articulação entre a Rede Social do Município, a Igreja, organizações voluntárias e organismos nacionais e internacionais.

Foto: mediotejo.net

Também está a decorrer uma recolha de bens, até dia 18, sexta-feira, com um carregamento de 24 toneladas a ser enviado para a fronteira para chegar ao povo da Ucrânia e aos refugiados retidos à espera de solução para acolhimento noutros países. Desta campanha solidária, os donativos sobrantes também serão direcionados para apoiar o grupo de refugiados acolhidos em Abrantes.

A adesão, diz o autarca Manuel Jorge Valamatos, tem sido “uma manifestação extraordinária” de solidariedade e de presença e união por todo o concelho.

Abrantes já acolheu 14 refugiados, e poderá vir a acolher mais 70 pessoas, sendo que destas, 30 ficarão a cargo da Paróquia de Abrantes.

Foto: CMA

O Pároco António Castanheira explicou que o processo vai ser feito em articulação com o Município, e desde logo a Igreja irá dispor da Casa Paroquial e de um prédio do Centro Social Interparoquial, apoiando conforme seja necessário, além do alojamento, com a alimentação, vestuário e outras questões que surjam e que estejam ao alcance da Igreja.

ÁUDIO | Padre António Castanheira, Paróquias de Abrantes – S. João e S. Vicente

Aludindo a esta iniciativa da vigília proposta pelo município que contou ainda com eucaristia para pedir paz para a Ucrânia e o fim da guerra com a Rússia, o pároco disse tratar-se de um “momento para suplicar o bem inestimável que é a paz”.

Foto: mediotejo.net

“Estamos a preparar-nos para receber ucranianos, para estarem algum tempo, transitoriamente. Assim o queremos. A igreja por duas vias: pela Paróquia, dispondo da Casa Paroquial, uma residência bastante grande e que acolheremos entre 8 a 10 pessoas. Estamos a adaptá-la e está praticamente no final o conjunto de obras que precisava”, começou por explicar.

Por outro lado, por via do Centro Social Interparoquial, também instituição da Igreja, poderão ser acolhidas mais de 20 pessoas, num prédio com três pisos.

“Tudo dentro da cidade de Abrantes e damos o que podemos dar. Penso que faremos bem em acolher estas pessoas que sofrem tanto e que vêm de lá refugiadas das bombas”, sublinhou.

Foto: mediotejo.net

Está previsto que até à próxima semana um dos edifícios esteja pronto a receber os novos residentes, e na próxima semana o outro.

À chegada poderão contar com integração e acolhimento por parte da comunidade, entidades e instituições locais, onde lhes é oferecida segurança, conforto e paz, longe da crueldade da guerra que irrompeu pelas ruas da Ucrânia, num conflito que vai subindo de tom nas últimas semanas.

FOTOGALERIA com momentos da vigília e eucaristia na Praça Raimundo Soares

Formada em Jornalismo, faz da vida uma compilação de pequenos prazeres, onde não falta a escrita, a leitura, a fotografia, a música. Viciada no verbo Ir, nada supera o gozo de partir à descoberta das terras, das gentes, dos trilhos e da natureza... também por isto continua a crer no jornalismo de proximidade. Já esteve mais longe de forrar as paredes de casa com estantes de livros. Não troca a paz da consciência tranquila e a gargalhada dos seus por nada deste mundo.

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